quarta-feira, março 19, 2008

Simanca e as armadilhas do cartum


Claudio Leal

Humorista cubano-baiano, Osmani Simanca é o autor do cartum "Faixa presidencial". A expressão infantil dos três presidentes sul-americanos (Evo Morales, Hugo Chávez e Lula) dá os braços a uma bem dosada desconfiança com as pretensões políticas do líder venezuelano. Olhares de vizinhos alertas, sutilezas diabólicas de um cartunista.

Nascido em Cuba, Simanca instalou sua prancheta - em definitivo? - no Brasil. Desde 1995, reside em Salvador, Bahia, onde colabora com a imprensa brasileira e mundial. Vencedor de prêmios internacionais, de Atenas a Teerã, envia seus cartuns à Grécia, Irã, França, China e onde houver homens e o esboço do ridículo.

Formou-se em pintura e desenho pelo Instituto Superior de Arte de La Habana. Na Ilha, colaborou com o jornal humorístico Dedeté. Neste pasquim, conseguiu publicar, além de desenhos, uma autocrítica do militante Simanca. A bem da verdade, um sarro do humorista. Com todos os cacoetes da fé no comunismo. Em texto irritantemente saboroso, conduziu à náusea as exigências e neuroses revolucionárias. Deixou de levar-se a sério e desde então aceitou o gosto de liberdade.

Cubano de raça - ele jura -, subiu a Sierra Maestra para exercícios juvenis. Guarda o pavor ateu de um guia do PC diante do pedido dos jovens revolucionários para conhecerem, no caminho de volta, uma igreja. Santa Virgem.

"Sou um materialista dialético", diz Simanca, em meio a discussões políticas. Mas trata de definir-se, antes, como "anarquista". Talvez um dia seja o "anarquista entristecido" das páginas de Eça de Queiroz. Nada sugere, por enquanto, o desânimo de sua pena.

O anticlericalismo de Osmani tanto pode atingir ao Papa quanto a Fidel Castro. Suspeita das roupagens clericais da política. Alma polêmica unida à galhofa baiana, adora dissecar os artigos do cardeal da Bahia condenando o aborto. Por missão ou prazer, leva o bom papo às mesas dos bares de Salvador. Divide cervejas, risos e argumentos com Cau Gomez, craque do cartum brasileiro, e o jornalista Gil Maciel, entre tantos amigos.

Nos jornais e revistas, constrói um humor sem palavras. Concentra no desenho a força de uma idéia. Desafio e herança do desenhista Saul Steinberg.

Um traço de Simanca, e logo o caricaturado aceita a rendição: das dobras generosas da faixa presidencial de Hugo Chávez ao sorriso mefistofélico do papa Bento XVI.

Há várias camadas de leituras nos traços falsamente infantis de seus cartuns. Nos detalhes, as garras do humor. Ficamos assim: o bispo não será um hipócrita se for representado com sua face deformada; preservando a aparência angelical, Simanca buscará na alma do religioso a desconstrução do santo pelo homem.

(Aviso: quem quiser conhecer mais do riscado, deve conferir o Blog do Simanca - http://simancablog.blogspot.com/ ).

Terra Magazine